O post sobre o poder do consumidor falou um pouco sobre a força que ele ganhou recentemente. Entre os assuntos mencionados falei da negociação do preço. Este é um fator muito relevante que pode ser mais detalhado.
Em matéria da Revista Exame Nº 1057 o jornalista Lucas Amorim fala da tendência do mercado de comprar apenas em liquidação. Os números impressionam e indicam que a grande maioria dos consumidores pararam de comprar produtos com preço cheio. Mais impressionante ainda é que a tendência não é apenas no Brasil, mas mundial. Segundo a matéria a JC Penney vendia em 2011 98,8% de seu estoque com desconto, e apenas 0,02% com preço cheio. Em 2012 as ofertas foram encerradas (no ano anterior a rede promoveu 590 liquidações), e o consumidor sumiu. As perdas totalizaram mais de 1 bilhão de dólares e a solução foi retomar a estratégia de redução de preços.
Esse comportamento tem gerado um fenômeno de liquidações. Algumas redes passam a maior parte do ano anunciando preços promocionais, em shoppings é praticamente impossível não ter pelo menos 5 lojas anunciando descontos em suas vitrines. O próprio calendário de promoções vem crescendo: a black friday, famosa nos Estados Unidos, começou por aqui em 2010 e em 2013 pegou de vez. A B2W (Americanas, Submarino, Shoptime) criou a Black Night. A Ricardo Eletro tem um dos seus picos de venda na tradicional liquidação pós carnaval. Até no mercado de bebidas eu já vi “liquidação” de produtos.
Acredito que esse processo é um ciclo vicioso. As empresas reduzem os preços buscando um aumento de vendas importante no curto prazo. O consumidor se acostuma com essas oportunidades e passa a esperar por elas. Quanto mais o consumidor aguarda pelas liquidações mais elas acontecem, já que as vendas não estão acontecendo com o preço cheio do produto. Para o consumidor é uma grande oportunidade que deve ser aproveitada, para as empresas um risco no longo prazo.
Sustentar uma empresa com margens apertadas nem sempre é fácil. Com certeza existem casos em que o produto oferece margem tão alta que permite uma redução de preço sem maiores danos às finanças, mas em geral as empresas tem sacrificado seu lucro para bater metas comerciais. Como isso impacta a estratégia de longo prazo?
Por um lado a empresa impulsiona suas vendas e se aproxima das metas, além disso realiza um negócio e tem a oportunidade de desenvolver um relacionamento com seu cliente. Aí começam a surgir os desafios. Será que é esse cliente, ávido por preços baixos e liquidações, que a empresa quer fidelizar? Pensando que um dos focos do marketing é conquistar e reter consumidores, tornando a marca parte de sua vida, fidelizar consumidores que tomam decisão baseados no custo é definir como principal diferencial de longo prazo o preço baixo. E como detalharei em um próximo post, preço não é diferencial competitivo de longo prazo.
Quando uma marca passa a se sustentar de promoções ela vai, gradualmente, eliminando seus atributos e posicionamento que possui. Uma marca forte faz com que o valor do produto não se resuma ao intrínseco (matéria prima, produção, embalagem). Se não há valor agregado os produtos são apenas commodities. Os profissionais de marketing tem como responsabilidade contribuir com as metas da companhia no curto prazo, mas defender a estratégia e competitividade da marca no longo prazo. Precisamos evoluir com o modelo de liquidação atual e investir na fidelidade do consumidor e valorização da marca, evitando que a empresa seja refém de preços promocionais.